A Parábola do Lobo e do Jardim das Ovelhas

A Parábola do Lobo e do Jardim das Ovelhas

Por: Uismael Freire

Em um vale distante, cercado por altas montanhas, havia um vasto jardim onde pastavam ovelhas brancas como a neve. O jardim era regado por um rio de águas puras, e seu solo era fértil, pois fora preparado por um grande Rei há muito tempo.

As ovelhas viviam livres, colhendo do jardim o que precisavam, e saltavam alegres sob o brilho do sol que jamais se escondia. O Rei havia deixado para elas um Livro de Jardins, onde ensinava que as flores, os frutos e a água eram dádivas, não trocas.

Certo dia, um estranho chegou ao jardim. Era um lobo, mas vestia um manto macio, tingido com o cheiro das antigas florestas. Ele trazia nas patas pergaminhos antigos, manchados e gastos pelo tempo. Subiu em uma grande pedra e falou com voz melodiosa:

   Queridas ovelhas, vejo que desfrutais do jardim… Mas sabíeis que deveis devolver parte dos vossos frutos, ou as raízes secarão? Trouxe comigo as palavras antigas, dos dias em que os ventos eram duros e a terra, rebelde!

As ovelhas, temendo a seca e o abandono, começaram a deixar aos pés do lobo montes de flores, cestos de frutos e jarras de água.

O jardim, contudo, começou a murchar. As flores já não eram tão coloridas, e o riso das ovelhas se tornou raro. O lobo, cada vez mais robusto, construía para si pequenas fortalezas entre as árvores.

Então, numa manhã, chegou um viajante. Trazia consigo uma harpa e um pequeno Livro dourado. Não gritou, não exigiu. Sentou-se junto ao rio e começou a cantar. Sua canção falava de um jardim que florescia pela confiança, não pela cobrança; de frutos que brotavam pela alegria, não pelo medo.

Pouco a pouco, as ovelhas se aproximaram. Não havia imposição em sua voz  apenas a lembrança suave de uma promessa antiga:
“Tudo o que o Rei plantou é vosso por amor. Dai conforme a música do vosso coração, e o jardim se encherá novamente de vida.”

As ovelhas começaram a trazer frutos e flores não por medo, mas por gratidão. Distribuíam entre si, sem peso ou obrigação, e o jardim, como por encanto, voltou a florescer.

O lobo, sem ter o que recolher, afastou-se silenciosamente para as florestas sombrias de onde viera.

E assim, as ovelhas aprenderam que o verdadeiro jardim do Rei nunca foi regido por pesos antigos, mas pela liberdade alegre do amor.

Explicação da Parábola:

  • O Jardim: Representa a Nova Aliança em Cristo, o terreno fértil da graça onde os crentes vivem livres e abençoados, conforme ensinam as epístolas de Paulo (2 Coríntios 9:8; Efésios 1:3).
  • As Ovelhas: Simbolizam os cristãos gentios da era da graça, que foram chamados à liberdade em Cristo (Gálatas 5:1), e não estão mais debaixo da maldição da lei mosaica (Romanos 6:14).
  • O Lobo Disfarçado: Representa falsos mestres e líderes religiosos que, utilizando trechos do Antigo Testamento fora de seu contexto, especialmente Malaquias, tentam impor sobre a Igreja a prática do dízimo obrigatório como um meio de controle e lucro (2 Coríntios 2:17).
  • O Pergaminho Antigo: São as palavras da Antiga Aliança (Lei Mosaica) aplicadas de maneira imprópria aos crentes da Nova Aliança, ignorando que a Lei foi cumprida em Cristo (Romanos 10:4).

O Viajante com a Harpa e o Livro Dourado: Representa o ministério apostólico de Paulo, o legítimo “ministério da reconciliação” (2 Coríntios 5:18-19), anunciando a liberdade do evangelho consumado, onde a contribuição é voluntária, feita com alegria, e nunca sob coação.

A Interpretação da Parábola

Você está diante de uma parábola que transcende a simplicidade da fábula. O jardim é símbolo da Nova Aliança em Cristo, conforme o apóstolo Paulo afirma em sua carta: 

“E Deus é poderoso para fazer abundar em vós toda graça, a fim de que, tendo sempre, em tudo, toda suficiência, abundeis em toda boa obra” 2 Coríntios 9:8.

É neste terreno fértil da graça que você é convidado a viver não pela exigência de um mandamento, mas pela suficiência da obra consumada de Cristo.

As ovelhas representam os cristãos gentios, os quais, como você, foram chamados à liberdade: 

“Para a liberdade foi que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes e não vos submetais de novo a um jugo de escravidão” (Gálatas 5:1). 

Estes já não vivem sob o jugo da Lei Mosaica, conforme explica Paulo: “Porque o pecado não terá domínio sobre vós, pois não estais debaixo da Lei, mas debaixo da graça” (Romanos 6:14).

O lobo disfarçado simboliza líderes e mestres religiosos que, embora se apresentem como guias espirituais, utilizam indevidamente passagens do Antigo Testamento especialmente o livro do profeta Malaquias para impor a prática do dízimo obrigatório. Paulo denuncia tais atitudes: 

“Porque nós não somos, como muitos, falsificadores da palavra de Deus; antes, em Cristo, é que falamos na presença de Deus, com sinceridade, da parte de Deus” (2 Coríntios 2:17).

Os pergaminhos antigos carregados pelo lobo representam a Lei Mosaica sendo aplicada fora de seu contexto histórico e teológico. A Escritura é clara: 

“Porque o fim da lei é Cristo para justiça de todo aquele que crê” (Romanos 10:4). 

Ao tentar reintroduzir a obrigação da Lei no contexto da graça, esses líderes contradizem a essência do evangelho.

Por outro lado, o viajante com a harpa e o Livro dourado representa o ministério apostólico de Paulo, cuja missão foi reconduzir os crentes à liberdade da Nova Aliança: 

“Ora, tudo provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo e nos deu o ministério da reconciliação, a saber, que Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo, não imputando aos homens as suas transgressões” (2 Coríntios 5:18, 19).

A Moral da História

A lição principal desta parábola é clara: utilizar textos como Malaquías 3:7-12, para exigir dízimos da Igreja de Cristo na Nova Aliança é uma deturpação da mensagem do evangelho. O texto foi dirigido a Israel, sob a aliança da Lei, no contexto da manutenção do templo e do sustento dos levitas, que não possuíam herança territorial: 

“E eis que aos filhos de Levi tenho dado todos os dízimos em Israel por herança, pelo serviço que prestam, o serviço da tenda da congregação” (Números 18:21).

A Nova Aliança, estabelecida pelo sangue de Cristo, redefine a maneira como você deve contribuir: “Cada um contribua segundo tiver proposto no coração, não com tristeza ou por necessidade; porque Deus ama a quem dá com alegria” (2 Coríntios 9:7). 

Aqui não há espaço para a coação, para a chantagem espiritual ou para a manipulação por medo.

A tentativa de impor o dízimo como um requisito obrigatório ignora a realidade do novo pacto: 

“Porque onde há testamento, é necessário que intervenha a morte do testador. Pois um testamento só é válido no caso de morte; visto que nunca tem força enquanto o testador vive” (Hebreus 9:16, 17). 

O testador, Cristo, já morreu e ressuscitou, estabelecendo uma nova forma de viver e de doar livremente, com amor e gratidão.

Por fim, qualquer ensino que tenta extorquir recursos dos fiéis por meio do medo da maldição está negando a suficiência da cruz de Cristo. Como Paulo declara com firmeza: 

“E isto por causa dos falsos irmãos que se intrometeram com o fim de espionar a nossa liberdade que temos em Cristo Jesus, para nos reduzirem à escravidão. Aos quais nem ainda por uma hora nos submetemos, para que a verdade do evangelho permanecesse entre vós” (Gálatas 2:4,5).

Uismael Freire é pesquisador independente e escritor com dedicação integral ao estudo das Escrituras, especialmente no campo da escatologia. Nascido em 1969, atuou como pastor por mais de duas décadas no meio evangélico, onde desenvolveu profundo envolvimento com a teologia tradicional. A partir de 2014, iniciou uma transição significativa em sua jornada espiritual, passando a estudar o preterismo completo – corrente teológica que entende que as profecias bíblicas, inclusive as do Apocalipse, já se cumpriram no primeiro século.

1 comentário

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José Marcos

Excelente texto. Parabéns continue firme e forte nessa missão.

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